Preste Atenção! O desempenho atencional ao longo do dia
A habilidade de prestar atenção se torna primordial para seu desenvolvimento e para o processo de aprendizagem.
O conceito de atenção é muito bem conhecido pelo senso comum e pode ser tido como a habilidade de focar e manter o interesse em uma dada tarefa. Em 1890, William James, conhecido como o pai da psicologia, trouxe o conceito de atenção como “a tomada de posse pela mente, de forma clara e vívida, de um dentre o que parecem ser vários objetos". Essa habilidade é primordial para o nosso dia-a-dia, uma vez que estamos em ambientes repletos de estímulos e eles devem ser selecionados de acordo com o objetivo pretendido e, transportando esse conceito para a rotina de uma criança, a habilidade de prestar atenção se torna primordial para seu desenvolvimento e para o processo de aprendizagem.
Situações de aprendizagem na escola exigem das mais diversas habilidades das crianças, como controle inibitório, controle comportamental, atenção seletiva, atenção sustentada, resolução de problemas e planejamento (Diamond, 2013). A atenção, intuitivamente, pode ser considerada essencial para o bom desempenho acadêmico, uma vez que os alunos precisam focar a atenção nas instruções dos professores para, então, compreender a matéria ou a atividade a ser realizada (para saber mais sobre Atenção, acesse a página do curso “Atenção: da teoria à avaliação”). Sabendo-se da importância da atenção para o bom desempenho escolar, compreender como a atenção se comporta ao longo do dia permitiria saber qual período seria o ideal para aproveitar ao máximo a capacidade atencional em sala de aula e, assim, favorecer o processo de aprendizagem.
Sabe-se que indivíduos têm preferências distintas de fase circadiana, isto é, alguns indivíduos têm melhor funcionamento ao longo da manhã e outros ao longo da tarde. Essa preferência é chamada de cronótipo e revela a que horas do dia as funções físicas do indivíduo, níveis hormonais, temperatura corporal, faculdades cognitivas e alimentação e os padrões de sono estão ativos. Diferenças na fase circadiana refletem diferentes preferências entre os indivíduos e permitem classificações como Cronótipo Matutino ou Cronótipo Vespertino. Tais preferências têm uma distribuição normal na população, independentemente da região geográfica, cultural ou do instrumento usado para avaliar essa tipologia (Levandovski, Sasso, & Hidalgo, 2013).
Em uma pequena revisão sobre o assunto, Escribano e Díaz-Morales (2014) encontraram que a flutuação atencional influencia a performance cognitiva e emocional de crianças, além de haver relato de aumento do alerta tônico (arousal) entre 08:00 e 16:00. Além disso, as autoras citam pesquisas que encontraram melhor desempenho em tarefas escolares realizadas pela manhã por indivíduos cronótipo matutino, e melhor desempenho quando a tarefa era realizada à tarde por indivíduos cronótipo vespertino. Esse efeito é denominado de efeito de sincronia. Pesquisadores também encontraram melhor desempenho de adolescentes em testes de inteligência quando o teste era realizado no período de preferência do sujeito, seguindo o efeito de sincronia, porém, para testes de vocabulário, esse efeito não foi encontrado (Goldestein et al., 2007).
Outro estudo também traz resultados quanto ao efeito de sincronia sobre a atenção sustentada, porém tal efeito foi observado somente em tarefas que demandam processos controlados, mas não foi observado em tarefas que demandam processos automáticos (Escribano & Díaz-Morales, 2014). Alguns autores defendem que a eficiência atencional varia de acordo com um padrão: o desempenho melhora entre o começo e o fim da manhã, diminui durante o recesso do meio-dia, e, então, melhora novamente. Escribano e Díaz-Morales (2014) também reportam resultados que vão de encontro com esse padrão de eficiência atencional quando, após avaliarem crianças e adolescentes de 12 a 16 anos de idade, concluem que a atenção aumenta ao longo do dia escolar, independentemente do cronótipo do aluno.
Entretanto, alguns estudos revelaram que esse padrão muda durante o ensino fundamental, se inverte em pré-escolares, e, após os 11 anos de idade, os níveis mais baixos de atenção ocorrem no início manhã e os mais altos no final da manhã e, em menor grau, no final da tarde. Em adolescentes, o cronótipo é mais tardio do que em qualquer outra faixa etária e, consequentemente, essa população costuma dormir mais tarde. Isso é problemático para os adolescentes que estudam no turno da manhã, pois resulta em deficiência de sono, fator que também influencia nível atencional. Em um estudo alemão, os autores encontraram que adolescentes cronótipo vespertino tiveram o pior desempenho em provas e testes escolares, além de o horário em que as provas eram realizadas influenciar o desempenho de adolescentes de diferentes cronótipos, isto é, adolescentes cronótipo matutino obtiveram desempenho significativamente maior quando as provas eram realizadas no início ou no final da manhã, enquanto que essa diferença entre desempenho deixava de ser significativa quando as provas eram realizadas no início da tarde (van der Vinne et al., 2014). É interessante ressaltar que nesse mesmo estudo os adolescentes vespertinos tinham desempenho inferior inclusive quando as provas eram realizadas na parte da tarde, o que pode indicar que o prejuízo atencional durante o horário de aula (que, nessa população, era pela manhã) impactava a aprendizagem desses alunos, resultando em desempenho inferior aos adolescentes matutinos.
O horário de aula atual no Brasil é dividido em turnos, manhã ou tarde, e, inclusive quando a escola é horário integral, as aulas expositivas continuam seguindo esses turnos. Assim como é debatido nos estudos citados, o horário de aula ou o horário de provas escolares poderiam ser pensados de acordo com essa flutuação atencional dos alunos. Alunos cronótipo matutino tem melhor desempenho atencional durante a manhã, enquanto que alunos cronótipo vespertino terão esse melhor desempenho durante a tarde. Contudo, quando avaliados como um único grupo, os alunos parecem ter um melhor funcionamento a partir da metade da manhã, com uma queda atencional próximo ao almoço, e voltam a ter uma melhora atencional até o meio da tarde. Pode-se, então, pensar que o horário escolar que melhor usufrui de um nível atencional ótimo seria entre 08:00 e 16:00 horas, e, quanto à realização de provas, o início da tarde seria o período que menos poderia privilegiar alunos matutinos ou vespertinos, mas sim garantiria o mesmo nível atencional para ambos os cronótipos.
REFERÊNCIAS
Diamond, A. (2013). Executive functions. Annual review of psychology, 64, 135-168.
Escribano, C., & Díaz-Morales, J. F. (2014). Daily fluctuations in attention at school considering starting time and chronotype: an exploratory study. Chronobiology international, 31(6), 761-769.
Goldstein, D., Hahn, C. S., Hasher, L., Wiprzycka, U. J., & Zelazo, P. D. (2007). Time of day, intellectual performance, and behavioral problems in morning versus evening type adolescents: Is there a synchrony effect?. Personality and individual Differences, 42(3), 431-440.
Levandovski, R., Sasso, E., & Hidalgo, M.P.. (2013). Chronotype: a review of the advances, limits and applicability of the main instruments used in the literature to assess human phenotype. Trends in Psychiatry and Psychotherapy, 35(1), 3-11
van der Vinne et al. (2014). Timing of Examinations Affects School Performance Differently in Early and Late Chronotypes. Journal of Biological Rithms,
Thaís Dell’Oro de Oliveira, Psicóloga, Mestre e Doutoranda pela Universidade Federal de Minas Gerais